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segunda-feira, 22 de junho de 2009

“A fé que faz bem à saúde”




Na edição da revista Época de 23 de março de 2009 trazia na capa a sua matéria “A fé que faz bem à saúde”. Em um país onde 99% das pessoas são religiosas foi uma sacada e tanto para vender mais revistas, mas o subtítulo me pareceu mais estarrecedor: “Novos estudos mostram que o cérebro é “programado” para acreditar em Deus – e que isso nos ajuda a viver mais e melhor”.

A matéria de Letícia Sorg começou bem elucidando a questão da “busca por explicações dos fenômenos” ser uma diferença básica entre nós e os animais, o homem primitivo acabava criando respostas sobrenaturais para os eventos que ele não entendia, o que na filosofia chamamos de pensamento mítico. Mas antes de chegar ao fim do primeiro parágrafo o artigo já me desagradou, simplesmente por que segue com a premissa:

Mas porque ela (Explicações sobrenaturais) desembocou na fé e no surgimento das religiões? Cientistas de diferentes áreas se debruçaram sobre a questão e chegaram a conclusões surpreendentes. Não só a fé parece estar programada em nosso cérebro, como teria benefícios para a saúde”.

O que há de errado aqui? Note que temos a afirmação de que “todos” os cientistas chegaram a essas conclusões (O que eu duvido muito) isso é uma “receita de bolo”, se você enfiar um “Está cientificamente comprovado” você atinge resultados incríveis com o publico, mas isso não é motivo para nos revoltar foi só um detalhe insignificante, o pior está por vir.

Segue um joguete de palavras, a frase de Charles Darwin é citada: “Uma crença em agentes espirituais onipresentes parece ser universal”, logo aparece outra colocação: “Somos predispostos biologicamente a ter crenças entre elas à religião”, mas essa segunda frase é de Jordam Grafman autor de alguns dos estudos que a reportagem aborda, contudo note que a frase de Darwin fica meio perdida aí, pare para pensar: o que Darwin disse foi apenas uma observação lógica, ele saiu viajando pelo mundo para fazer seus estudos e constatou que temos uma diversidade religiosa, mas isso não afirma em nada o que Jordam defende sobre “vocação inata para religião”, Na verdade nem o Jordam fala exatamente isso, pois há uma diferença em crenças (mito) e a tal religião, mas mais a frente vamos perceber isso.

Segundo a revista, Jordam chegou à conclusão de que a capacidade de crer em um ser superior possivelmente surgiu ao mesmo tempo em que a habilidade de prever o comportamento de outra pessoa o que é “fundamental para a sobrevivência e formação da sociedade” isso porque em sua experiência onde pessoas que liam frases sobre a existência de deus (A favor ou contra) e tinham seus cérebros examinados através de ressonância magnética, pode se constatar que a parte do cérebro que era ativada era a mesma usada para entender as emoções e as intenções de outras pessoas. Bem, eu não entendi porque ele chegou a tal conclusão diante desses fatos, me parece obvio que tal coisa aconteceria uma vez que as pessoas tratam deus como “outra pessoa” a se pensar. Por fim, eles acertam em afirmar que “deus é uma explicação eficiente para aplacar a necessidade de entender o que não se pode explicar com o conhecimento comum”, mas ainda bem que na história nem todos se contentaram com respostas fictícias e buscaram os “porquês” das coisas, assim surgiram filosofia e ciência superando de certa maneira a postura mítica de conhecer o mundo.

Surge um tal de Barrett autor do livro "Why woult anyone believe in God? "(Por que alguém acreditaria em Deus?) jogando a seguinte revelação: há evidências que sistemas religiosos ajudam a manter comunidades unidas! Serio? Precisaram fazer pesquisas para descobrir isso? Bem, é “obvio” qualquer grupo social tem tendência a ser unido, por isso são “um grupo”, Assim sabemos por que aqueles cinco “funkeiros” juntaram o outro rapaz de porrada quando ele esbarrou em um deles, Parabéns Barrett! Você é o cara! (Desculpe-me o exemplo apreciadores do funk, mas foi o primeiro que em veio a mente).
Aqui eu tive uma teoria, a mecânica é simples, você joga um monte de comentários óbvios e vende sua idéia falsa qualquer no meio, Assim você convence as pessoas! Que pena, mas isso não é original, na Grécia antiga já se usava silogismos tanto que Aristóteles desenvolve a lógica para combater esse tipo de discurso.

Mas Barrett não para por aí! Ele afirma que a mente das crianças são exemplos viáveis de como a fé se manifesta precocemente na vida humana! Usando uma experiência ridícula ele constatou que aos cinco anos crianças conseguem ter uma idéia da onisciência de deus. Acho que não seria necessário comentar a besteira dessa experiência como critério afirmativo de qualquer tese a cerca de deus, mas vamos lá: Bem, sabemos muito bem que crianças não são religiosas, (Ou deveríamos saber) você não pode dizer que uma criança é católica, mas sim que seus pais o são, da mesma maneira que um pai coloca a camisa de um time de futebol na criança e “condiciona” a criança a ser torcedora dele, a religião é “implantada” nas crianças, ouvimos falar em deus antes mesmo de entender o que são palavras e me parece perfeitamente lógico que aos cinco anos uma criança consiga ter uma idéia de que deus é um ser diferente ainda mais porque “papai do céu” fica triste quando fazemos algo ruim e ele sabe quando acontece! Ele sabe tudo.

Eis que surge Richard Dawkins, biólogo evolucionista e ateu militante apenas para ser usado como referencia para descaracterizar a crença religiosa como “mero efeito de estímulos eletromagnéticos em uma parte especifica do cérebro”, Uma pena queria ver algum comentário dele a cerca do assunto, mas não teve espaço, Afinal o objetivo era mostrar de uma maneira “incompreensível”, “enigmática” a questão da fé e o cérebro humano.

Surge um novo personagem, Andrew Newberg e o que eu ele nos traz de novo? Mais estudos científicos, Newberg estudou por 15 anos as manifestações cerebrais e constatou que as priáticas religiosas acionam partes do cérebro como os lobos frontais (responsáveis pela concentração) e os parietais (Que nos dão consciência de nós mesmos e do mundo) bem, em seu novo livro How God changes the brain (“Como deus muda seu cérebro”) A turma de Newberg aborda os efeitos da fé sobre o cérebro e a vida das pessoas e estudam os efeitos em longo prazo das práticas religiosas, ele inclusive lista técnicas de meditação para crentes e ateus praticarem, Opa! Sabe por quê? Meditação não precisa ser relacionada necessariamente a religião ou mesmo ser considerada um a prática religiosa, mas isso não fica claro em nenhum momento do artigo.

Newberg entra em jogo com as explicações de que ao meditar o tais lobos frontais ficam mais ativos, (Alô! Se o treco diz respeito à concentração, eu acho que é muito obvio que se meditarmos eles ficam mais ativado porque na minha ignorância entendo que meditar exige e é prática de concentração) e o lobo pariental fica menos ativo, aquela parte que diz respeito à noção de espaço e tempo, logo teríamos uma sensação de “atemporalidade” relatadas pelos religiosos místicos etc, Mais uma coisa obvia para você ter certeza de que está cientificamente comprovada.

Mas o que eu ganho com isso? Bem, Segundo esses cientistas a pratica de meditação favorece a uma boa memória e diminuição da ansiedade até aqui tudo bem, não é de se surpreender que isso aconteça, o problema é insistência no termo de “práticas religiosas” uma vez que eles mais tem focado a meditação que não é necessariamente uma prática religiosa.
Chegamos a uma parte que eu realmente estranhei, Dois estudos canadenses (mais estudos) mostraram que um teísta tende a se dar melhor com os próprios erros do que um ateu, isso por que nas experiências (que se resumiam a perguntar quais eram as cores) constatou que as erravam, a área do cérebro chamada “córtex cingulado interior” era ativada, o fato é que os ateus tinham uma maior atividade cerebral nessa área do que os teístas o que segundo Michael Inzlicht responsável pela pesquisa: “Quanto mais forte a religiosidade e a crença das pessoas menor era a resposta dessa região ao erro”.
Agora me explica aí, anteriormente estávamos vendo que atividade cerebral aumentada de alguma maneira era boa, (Na revista tem até as fotinhas do cérebro mostrando os níveis quando as pessoas meditavam ou oravam), já nessa experiência com ateus é algo ruim? Desculpem-me tamanha ignorância, mas não entendo os critérios, para mim isso mostra que um teísta tende a ser mais “conformista” que um ateu em relação aos próprios erros, o que não é necessariamente algo bom.

A matéria segue frisando que quem pratica religião tende a ter uma saúde melhor, surge argumentos como “A religião influencia hábitos mais saudáveis” pois tornaria mais fácil para a pessoa a resistir a tentações nocivas à saúde como álcool e fumo afinal “Para pessoas que acreditam na vida após a morte, pode ser uma decisão racional postegar os prazeres de curto prazo em nome da recompensa eterna” afirma Michael McCullough que estuda a maneira como religião molda a vida das pessoas. O raciocínio tem um sentido, mas me parece que na prática ele não funciona, afinal, se 99% dos brasileiros são religiosos, as porcentagens de alcoolismo e tabagismo ou mesmo qualquer outra prática nociva deveriam ser menores, resta saber ser o 1% de ateus tem uma vida saudável, o que me parece bem provável por experiência própria.

Na coluna lateral temos uma breve entrevista com o dito cujo, Andrew Newberg diz “O cérebro dos ateus é diferente”, contudo das quatro perguntas impressas somente a ultima tinha haver com a questão, mas notei algo que me surpreendeu, Newberg parecia outra pessoa com suas próprias palavras, enquanto a Época insistia com perguntas como “Existe alguma diferença entre catolicismo e budismo?”ele respondia: “Não olhamos exatamente para as diferentes religiões, mas para as diferentes práticas. A forma como você prática religião é mais importante do que as idéias religiosas em si.”

Sobre as diferenças do cérebro ateu e o do teísta ele foi obscuro: “Encontramos algumas diferenças, e também notamos diferenças dependendo do tipo de pratica religiosa. O problema é que nunca sabemos se aquelas mudanças estão lá porque a pessoa é religiosa há muito tempo ou se ela nasceu daquela maneira e, por causa disso procurou um tipo de religião ou meditação”.

O artigo termina com outra entrevista, dessa vez com Jordan Grafman dizendo “A crença é necessária”, Mais uma vez senti uma inclinação errada da Época insistindo com termos que não são exatamente o que os cientistas falam, ela pergunta: Somos biologicamente predispostos à religião? E Grafman responde: “Eu diria que somos predispostos biologicamente a ter crenças, e a religião é uma delas, mas não a única

A ultima frase da matéria é “A crença religiosa surgiu no cérebro antes de outras crenças, segundo pesquisas”, Mas o raciocínio que levou a essa conclusão supostamente de Jordam novamente é baseado em teorias e seus estudos não afirmam isso como ele mesmo diz: “Nossa hipótese é que a crença religiosa seja a primeira forma de sistema de crenças, que surgiu antes das outras”. Então temos mais uma coisa obvia cientificamente comprovada não acha? Não me parece surpresa que na história na humanidade nossos cérebros no processo de evolução biológica tenham passado por isso, afinal é como foi dito lá no começo da matéria, os homens primitivos quando não conseguiam entender algo inventavam as forças sobrenaturais antropomórficas, essas crenças/mitos só eram derrubadas conforme o pensamento filosófico/cientifico amadurecia o que me leva a pensar: Deve ser por isso que é tão difícil para as pessoas se libertarem dos vários mitos, por que é uma coisa enraizada, pensando assim até faz sentido os estudos desses caras.

O artigo termina sem acrescentar muito as nossas vidas, por que no final não basta crer em alguma coisa, o modo como você prática religião pode ou não levá-lo a uma vida mais saudável e lembrando que, os estudos focaram mais a meditação que não é necessariamente uma prática religiosa, resta esperar novos estudos para eles descobrirem que yoga também faz bem a saúde (Sim! Eles não estudaram se o yoga tem tais efeitos).

No final da revista encontramos um texto show de bola de Ruth Aquino intitulado “O besteirol da ciência é melhor que no senado”, achei super coerente e engraçado uma vez que poucas paginas atrás constatei o que Ruth ironiza, quem puder confira.


Abraço

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